— E você, por que desvia o olhar?
(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarra-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)
— Ah. Porque eu sou tímida.
Sim, eu sei.
Pode parecer maluquice,
mas eu vou mesmo desparafusá-las
e arremessá-las no jardim.
Mesmo que elas não possam voar,
ficarão entre as flores,
o devido lugar de borboletas paralíticas.
Não suporto mais essa idéia de abrir a janela,
levantar os vidros e vê-las ali,
disfarçadas de dobradiças.
Alguns escrevem pela arte, pela linguagem, pela literatura. Esses, sim, são os bons. Eu só escrevo para fazer afagos. E porque eu tinha de encontrar um jeito de alongar os braços. E estreitar distâncias. E encontrar os pássaros: há muitas distâncias em mim (e uma enorme timidez). Uns escrevem grandes obras. Eu só escrevo bilhetes para escondê-los, com todo cuidado, embaixo das portas.
Vivo tão intensamente o momento, que quase chego atrasada ao momento seguinte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário