quinta-feira, 27 de maio de 2010

Meu Querido Inimigo

O título da presente coluna não parece, de início, ser muito coerente, posto que tendemos a associar sentimentos poucos nobres à figura de nossos inimigos. Será que estamos certos?
Temos a pragmática e ocidentalizada noção de que os problemas que nos apresentam destinam-se unicamente a nos importunar e esquecemos que todos os obstáculos que nos são oferecidos objetivam testar as nossas capacidades e virtudes, a exemplo do que nos ensinam as jornadas do herói na mitologia grega. Senão vejamos.
Analisando os diversos mitos gregos, - e para isso não é necessário ser nenhum especialista em narratologia - podemos observar que há uma série de características comuns que adornam os heróis daqueles contos, constituindo-se em elementos de narrativas quase que invariáveis, o que aponta para o perfil de verdadeiros heróis arquétipos. Todos são dotados de algum dom ou virtude especial concedido pelos deuses, necessário para a superação das suas batalhas vindouras. Buscam desempenhar seus papéis por vocação e por livre escolha, como fica bem claro no diálogo entre Aquiles e sua mãe, que antecedeu a partida dele para a guerra de Tróia. Um outro requisito é o altruísmo inerente aos atos do herói. Ele não busca o prazer próprio, mas a superação dos obstáculos com um escopo divino ou coletivo.
Como exemplo, cito, em uma apertada síntese, o mito de Teseu, filho de Egeu, rei de Atenas, que se voluntaria para ser oferecido ao Minotauro, de Creta. Teseu conserva a esperança de matar o monstro e libertar o seu povo do pagamento do pesado tributo de enviar anualmente carne humana para ser devorada. A filha do rei Minos, Ariadne, apaixona-se pelo herói e o ajuda a matar o Minotauro. Saindo-se vencedor da luta, Teseu retorna a sua terra e torna-se o rei de Atenas.
Como podemos observar é graças ao Minotauro que Teseu tem a oportunidade de colocar em prática os seus dons, que o levam, após as diversas batalhas vencidas, tornar-se o rei de Atenas.
Outro mito interessante é o do herói grego Perseu, filho de Zeus, que com a ajuda de Atena e Hermes, que lhe presentearam, respectivamente, um escudo mágico e sandálias aladas, conseguiu matar Medusa.
Com efeito, sem o Minotauro não haveria Teseu, sem Medusa não haveria Perseu, sem Tróia não haveria Aquiles e Ulisses, sem vilão não haveria herói.
Um fato histórico que enaltece o respeito oferecido ao inimigo é a guerra civil romana travada entre Júlio César e Pompeu, na qual este último ao ser derrotado em uma batalha na Grécia, foge para o Egito. César o persegue e ao chegar às terras das pirâmides descobre que o rei Ptolomeu XIII, em busca da afeição do regente romano, havia mandado matar seu inimigo. Desolado com a traiçoeira morte do inimigo, César destrona o rei egípcio e empossa Cleópatra. Por ironia do destino, o grande ditador César viria a morrer esfaqueado, em razão de uma conspiração de parte dos senadores contra ele, no Senado romano aos pés de uma estátua de Pompeu.
Nesse contexto, destaco Sêneca (in Sobre a Divina Providência e Sobre a Firmeza do Homem Sábio:
“Sem adversário a coragem definha: somente fica claro o quanto ela é grande e a quanto chega seu poder quando ela mostra, ao suportar o sofrimento, de que é capaz.
É bom que saibas que o mesmo deve fazer o homem de bem: que não se apavorem diante dos fardos duros e difíceis, nem se queixem do destino; o que quer que ocorra tome por bem, convertam em bem; o que importa não é o que é, mas o modo como tu suportas.”
Assim sendo, creio que não convém que vejamos as provas dos diversos concursos públicos como empecilhos para a obtenção dos cargos que desejamos, mas sim, como mecanismos que nos permitirão atingir o tão almejado sonho.

Disponível aqui.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Prova de Fogo (Literalmente!)

Acabo de provar que posso viver sozinha. Pra quem? Pra mim, ora bolas!
Matei uma aranha. Tá pensando que é fácil? Pode até parecer. Mas não é não.
A coisa peluda surgiu na lavanderia e acelerou em direção a porta da cozinha, mas foi atingida por uma vara de bambu antes de conseguir seu intento...meio dramático matar caranguejeira com bambu, mas vá lá...foi o que foi. Mas, difícil mesmo foi colocar fogo na peste usando álcool em gel bactericida  e Fiat Lux palitos longos. Se ainda acha que é fácil, da próxima vez que te aparecer uma...tenta.

Juntos sim. Grudados jamais.

É incrível como algumas pessoas se anulam depois que casam. Perdem a noção e o senso do ridículo muitas vezes. Deixam de estudar, abandonam seus empregos, abdicando de sua independência financeira. Sentem como se os cônjuges fossem propriedade particular, um objeto, algo feito para exibir por aí como um troféu ou pior, uma bengala, alguém em quem se apoiar para sobreviver.

Num casamento, devemos servir de apoio sim, mas fortalecendo o outro. Devemos ter o nosso próprio espaço, o nosso próprio tempo. Fazendo do outro um companheiro agradável para nos acompanhar durante o nosso caminho, aquele que vai deixar tudo mais colorido, mais florido, mais alegre. O que não quer dizer que temos que alterar a rota traçada por causa disso.

As fraquezas nunca vão deixar de aparecer, pois independente de qualquer coisa somos humanos e estamos suscetíveis a carências, a intolerância, a inseguranças entre outras coisas. O que devemos observar é o quanto pequenas atitudes chatas pesam na balança da relação, pois de repente está pesando muito mais para um lado do que para o outro e a situação fica insuportável. Devemos procurar o equilíbrio. E ele está lá, dentro de nós. Mas só será atingido depois daquela conversa franca num momento de insônia a dois.

O casal não precisa ficar grudado o tempo inteiro, cada um tem sua vida e suas preferências. A frase que falamos na igreja diante do padre deve ser alterada para “na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-te e respeitando-te enquanto a minha paciência achar que é conveniente”. Daí sim, podemos entender melhor a situação que nos espera diante do altar.

Nessa vida ninguém é de ninguém e podemos escolher quem realmente vale à pena. Com amor, afeto e respeito à individualidade. Pena que nem todo mundo pensa assim. Preferem viver infelizes para sempre até que a morte os separe. A vida é muita curta para escutar música ruim e ficar grudado em gente assim. Pelo menos é o que eu acho.
 
Escrito na quarta-feira, 19 de maio de 2010 por Renata do Blog Esconderijo da Renata

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Comer, escrever, amar

Antes de sair, deixou um bilhete sobre o fogão:
Tem frango no forno. Falta temperar a salada. O arroz é de ontem. O beijo é de hoje.
Apanhou a bolsa, os livros.
Desceu as escadas correndo, tinha só quinze minutos.
No caminho, lembrou-se.
Faltou escrever que tinha uvas fresquinhas.
Pensou em ligar e deixar um recado na secretária eletrônica de casa.
Desistiu.
A Clarisse já anunciara um milhão de vezes: precisava parar com isso.
Essa mania de se preocupar se todos à volta estão nutridos, gordos, corados.
O marido encontraria as uvas ao abrir a geladeira, Clarisse teria dito.
E se não as encontrasse?
Se não as encontrasse é porque ele não estava com vontade de comer uvas, respondeu mentalmente pela terapeuta.
Estava indo bem nas sessões.
Guardou o celular na bolsa.
Orgulhosa.
O orgulho foi se dissolvendo aos poucos, deixando em seu lugar a dúvida.
Impossível separar feminino e alimento, concluiu.
Quem é que amamenta?
A divindade que toma conta da agricultura é uma deusa, e não um deus.
Ceres para os romanos, Deméter para os gregos, é mulher.
Não é homem.
Ela simboliza o materno, o nutritivo.
A palavra cereal vem daí.
Pegou o celular, Mas ele é tão distraído… Então é problema dele – pareceu ter ouvido a Clarisse, já brava, dizer.
Guardou o aparelho novamente na bolsa.
E sua mão ficou lá dentro, como que anexada a ele.
Todos os dias, ela escrevia bilhetes para o marido.
Instruções para a cozinha em geral.
Onde estava isso, como se preparava aquilo, quantos minutos no microondas.
Não se encontravam à noite.
Ela saía para a aula enquanto ele ainda não havia chegado do escritório.
E no dia seguinte, ao raiar do sol, a checagem: Jantou direitinho ontem?
Ela não estava, genuinamente, preocupada se o outro limpara o prato, se achara o bife à milanesa no tupperware.
Perguntar era um movimento automático, um instinto ancestral de amor e proteção à espécie, quase incontrolável.
Um mistério, contudo decifrável; tinha a Clarisse, que estava ajudando as coisas a ficarem mais claras.
Intervalo da primeira aula, o celular toca.
É o marido.
Com brutal naturalidade, ele dispara o míssil: O Bob está sem comida.
Onde fica a ração?
Ela pede um minuto aos colegas, afasta-se da roda, respira fundo.
Sente-se esmagada pela fome excruciante que o cachorro poderia ter sentido naqueles intermináveis instantes.
Declara-se incapaz de cuidar de outro ser vivo.
Clarisse, desta vez, não vem ao seu socorro.
Ela, então, chora.
E desliga.

Fonte: Fio da Meada

terça-feira, 4 de maio de 2010

Eu te amo...Não diz tudo!

Você sabe que é amada porque lhe disseram isso?
A demonstração de amor requer mais do que beijos, sexo e palavras.
Sentir-se amado é sentir que a pessoa tem interesse real na sua vida, que zela pela sua felicidade, que se preocupa quando as coisas não estão dando certo, que se coloca a postos para ouvir suas dúvidas, e que dá uma sacudida em você quando for preciso.
Ser amado é ver que ele lembra de coisas que você contou dois anos atrás, é ver como ele(a) fica triste quando você está triste, e como sorri com delicadeza quando diz que você está fazendo uma tempestade em copo d'água.
Sente-se amado aquele que não vê transformada a mágoa em munição na hora da discussão.
Sente-se amado aquele que se sente aceito, que se sente inteiro.
Aquele que sabe que tudo pode ser dito e compreendido.
Sente-se amado quem se sente seguro para ser exatamente como é, sem inventar um personagem para a relação, pois personagem nenhum se sustenta muito tempo.
Sente-se amado quem não ofega, mas suspira; quem não levanta a voz, mas fala; quem não concorda, mas escuta.
Agora, sente-se e escute: Eu te amo não diz tudo!

A tristeza é feia e quer casar [Silmara Franco]

Está no dicionário: Tristeza: [Do lat. tristitia.] S.f. 1. Qualidade ou estado de triste. 2. Falta de alegria. 3. Pena, desalento, consterna...