quinta-feira, 10 de março de 2011

O Vampiro

Tu que, como uma punhalada,
Em meu coração penetraste
Tu que, qual furiosa manada
De demônios, ardente, ousaste,
De meu espírito humilhado,
Fazer teu leito e possessão
- Infame à qual estou atado
Como o galé ao seu grilhão,
Como ao baralho ao jogador,
Como à carniça o parasita,
Como à garrafa o bebedor
- Maldita sejas tu, maldita!
Supliquei ao gládio veloz
Que a liberdade me alcançasse,
E ao vento, pérfido algoz,
Que a covardia me amparasse.
Ai de mim! Com mofa e desdém,
Ambos me disseram então:
"Digno não és de que ninguém
Jamais te arranque à escravidão,
Imbecil! - se de teu retiro
Te libertássemos um dia,
Teu beijo ressuscitaria
O cadáver de teu vampiro!

Certa noite bem junto a uma horrenda judia,
Como ao longo de um morto outro morto estendido,
Pus-me a pensar ao pé deste corpo vendido
Na beleza infeliz que aos olhos me fugia.
Eu lhe evocava a esplêndida altivez nativa,
O olhar de intensa luz e de graças armado,
O cabelo a servir-lhe de elmo perfumado
E cuja súbita lembrança o amor se aviva.
Pois com fervor teu nobre corpo eu beijaria
E dos réus frescos pés às tuas negras tranças
Abriria o tesouro das carícias mansas,
Se uma noite, ao rolar de uma lágrima esguia,
Pudesses, tu, que apenas esse fel destilas,
Ofuscar o esplendor de tuas frias pupilas.

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